fazenda Cedro I, na região do rio Corumbá
A sede da fazenda Cedro I é provavelmente a de construção mais recente, dentro do conjunto de edifícios selecionados para estudo. Apresenta fachadas com aplicação de elementos ecléticos, como o beiral em cimalha, em oposição ao beiral encachorrado, próprio dessa arquitetura, sobrevergas nas portas e janelas e um alpendre com arcos e parapeito. É bom observar que tais elementos não são exclusivos do ecletismo, aparecendo na arquitetura de períodos anteriores, mas, a forma como são encontrados nesses edifícios, remete ao trabalho decorativo da arquitetura eclética de fins do século XIX e que, pela forma lenta com que se espalhou pelo interior do Brasil, vai ter grande aceitação e desenvolvimento em Goiás, a partir da década de 1920, estendendo-se até princípios da de 1950.
detalhe do beiral acimalhado com o canto da parede imitando pilar estrutural
O ecletismo chega em nosso estado através da implantação da rede ferroviária, trazendo para a arquitetura goiana, o uso de elementos construtivos tais como o tijolo queimado, que vem substituir o uso do adobe e do pau-a-pique, empregados desde o início da ocupação, na década de 1720, a telha francesa, que, além de substituir a telha canal, muda a forma de estruturação do telhado, substituindo o pontalete pela tesoura, o cimento, e mesmo formas de agenciamentos internos, em que os cômodos passam a se apresentar de forma mais independentes, isolados um dos outros, principalmente na questão dos acessos.
Assim, com pequenas diferenças nas dimensões dos compartimentos internos, a sede da fazenda Cedro I apresenta uma composição interessante, onde prevalece o equilíbrio das formas, com paredes alinhadas, provocando o aparecimento de compartimentos rebatidos, em relação a um eixo imaginário traçado sobre sua planta.
vista geral do edifício e o estado de abandono do entorno
Os novos conhecimentos técnicos possibilitam a criação de um pátio interno, com a planta do edifício se estabelecendo na forma da letra U. Isso pode ser observado na diversificação de caimentos do telhado, com associação de várias formas de tesouras, com cumeeiras e rincões, onde se estabelece um corpo principal com dois outros secundários, de alturas diferenciadas. No piso é abandonado o tradicional tabuado para ser utilizado o cimento queimado, em toda a edificação, considerado à época, como de mais fácil manutenção e higiene.
Apesar de toda a inovação apresentada na organização interna desse edifício, algumas questões da tradição permanecem, como que arraigadas à forma de vida das populações rurais do estado. Elemento próprio dessa forma de viver é a existência do chamado “quartinho da sala”, quarto destinado a acolher hóspedes de pouca intimidade com os membros da família, localizado em planta, de forma a ter seu acesso voltado para a sala de visitas, sem contato mais direto com os ambientes destinados à família, como a varanda e cozinha. Também a cozinha, com o tradicional fogão a lenha, ou fogão caipira, e um pequeno compartimento destinado ao armazenamento de víveres, situado ao fundo.
detalhe dos arcos do alpendre com relevo de sobreverga do arco, feito em massa de reboco
E, como elemento completamente diferenciado, a existência de um pequeno jardim na parte fronteira da edificação, ficando o curral estabelecido na lateral, pra onde se abre também o pequeno alpendre do edifício. Temos, assim, dois acessos para a residência, estando um voltado para a estrada e utilizado como oficial para os visitantes, para onde se abre a porta principal e está voltada a sala de visitas. Na lateral, o alpendre faz a ligação do curral – local de trabalho externo – e a varanda – local de trabalho interno – demonstrando na distribuição do trabalho, as novas formas de se pensar o espaço. A sala, nesse momento, passa a ser utilizada somente como local de recepção, passa a ser realmente uma “sala de visitas”, isolada de qualquer incômodo provocado pelo trânsito de serviço, e a passagem, ou entrada de serviços acontece na lateral da edificação, pelo alpendre, ligando diretamente o curral à varanda e à cozinha.
Assim, a localização do curral ao lado da edificação, permite uma melhor visualização da fachada principal, a implantação do jardim, o isolamento do acesso principal e melhor apresentação e limpeza quanto à sala de visitas.
Organização interna
A planta baixa da sede da fazenda Cedro I, inova na organização interna das sedes tradicionais encontradas no estado, tanto no que se refere à sua distribuição quanto na forma como os cômodos estão dispostos.
Existe aí, uma organização em que se pode observar três faixas de distribuição, tanto no sentido transversal quanto longitudinal. No primeiro caso, temos a primeira faixa composta pela sala de visitas, quarto de hóspedes e um dos quartos internos da residência. Na segunda faixa, aparecem o alpendre, a varanda e um pequeno quarto, com dimensões próximas às do alpendre. Convém observar, aqui, que esse pequeno quarto é um elemento fundamental da tradição arquitetônica goiana, tanto rural quanto urbana. Trata-se de um compartimento utilizado para atividades como costura – é comumente chamado quarto de costura – ou ainda como apoio, sendo utilizado para guarda e estoque de roupas de cama ou ainda apoio à copa e demais atividades desenvolvidas na varanda.
fachada lateral mostrando as janelas da sala, os arcos do alpendre e as janalas da cozinhaNa terceira, comparecem quarto, pátio, cozinha, banheiro, despensa e um pequeno quarto e, com um pouco mais de observação, poderemos perceber, dessa faixa, isolar uma outra, de menores dimensões, composta pelo pequeno quarto, alinhado com a despensa e o banheiro.
Se observarmos a planta no sentido longitudinal, poderemos encontrar uma primeira faixa composta somente de quartos e uma pequena parte da varanda. Uma segunda faixa está composta pelo quarto de hóspedes, a parte central da varanda e o pátio interno. Na terceira faixa, a sala de visitas, alpendre, a parte final da varanda, cozinha, despensa e banheiro.
Predomina nessa construção uma organização baseada na simetria de distribuição e composição, com alinhamento quase perfeito das paredes e, internamente, o declive do terreno, diferente das demais sedes conhecidas, de caráter tradicional, não aparece no interior da residência. Um pequeno degrau promove a mudança de nível entre o interior e o pátio e, desse para o terreno posterior ao edifício, uma escadaria larga, de sete degraus com espelhos de alturas variadas.