REFLEXOS
DA ARQUITETURA IBÉRICA DE ORIGEM ISLÂMICA
NA
ARQUITETURA BRASILEIRA
No decorrer do século XX, dois
importantes trabalhos foram elaborados relacionando a arquitetura brasileira a
uma matriz ibérica de origem muçulmana. O primeiro deles, intitulado Influências muçulmanas na arquitetura
tradicional brasileira, de autoria do médico e historiador da arte José
Marianno Filho, publicado nas primeiras décadas do século XX, buscava nessas
referências as bases que justificariam sua preocupação e defesa em relação a
uma arquitetura de caráter eminentemente brasileiro, que seria o Neocolonial.
É sabido de todos os que se interessam
pelo estudo da história da arquitetura brasileira que José Marianno Filho e o
arquiteto português radicado em São Paulo, Ricardo Severo, foram os maiores
defensores e teóricos desse modelo arquitetônico que, por longo tempo foi
relacionado ao ecletismo e que, só agora, iniciado o século XXI, começa a ter
reconhecimento e estudos específicos, no sentido de melhor entendimento com
direito a ocupar um espaço próprio na linha de desenvolvimento de nossa
arquitetura. Foi também Marianno Filho incentivador de pesquisas, chegando
mesmo a bancar viagens de alunos de arquitetura às cidades mineiras do período colonial
para organizarem estudos e levantamentos visando uma maior compreensão das
técnicas e do modelo tradicional como base para futuros projetos em que o
Neocolonial fosse a principal referência, já que acreditava ele ser esse o
modelo arquitetônico que melhor representava nossa cultura, baseada nas
tradições que formaram e estruturaram o Brasil ao longo já de quatro séculos de
existência.
Escola projetada por José Amaral Neddermeyer com caracterristica neocolonial
Ao longo do período em que esses estudos
se desenvolveram, é histórico o desentendimento entre Marianno Filho e um de
seus alunos mais promissores, Lúcio Costa, quando este, abandonando o barco do
Neocolonial, vinculou-se ao Modernismo corbusiano, naquele momento o principal
inimigo a ser combatido pelo grupo liderado por Marianno, o que se constituiu
em um duro golpe no andamento dos estudos e pesquisas organizados pelos
neocolonialistas. Convém observar que, inicialmente, as baterias dos defensores
do Neocolonial estavam todas voltadas contra a arquitetura de caráter eclético
e academicista de origem européia que, segundo Marianno Filho e seus
seguidores, representava uma interferência pouco construtiva ao bom
entendimento de nossas tradições e fazeres arquitetônicos.
O segundo trabalho, de autoria do
arquiteto Eduardo Kneese de Mello, intitulado a herança mourisca da arquitetura brasileira, já iniciada a segunda
metade do século, trazia um outro enfoque ao assunto, objetivando, nesse
momento, mostrar em que medida a influência da arquitetura ibérica de origem
islâmica contribuiu para o desenvolvimento de uma arquitetura de caráter
modernista, eminentemente brasileira.
projeto de Lúcio Costa utilizando balcão e elemento vazado, influência da arquitetura mourisca
Kneese de Mello, que se gabava de
possuir o registro de n° 1 do IAB-SP – Instituto dos Arquitetos do Brasil,
seção São Paulo – foi um dos grandes defensores da arquitetura moderna, tendo
ao longo de sua vida publicado livros, artigos e inúmeros estudos, além de
proferido palestras e conferências sobre a arquitetura brasileira, em especial
aquela produzida no século XX.
Assim, dois estudos sobre o mesmo
assunto são apresentados com objetivos de interesses opostos, ou seja, cada um
pretendendo defender seu ponto de vista – o Neocolonial de José Marianno Filho
e o Modernismo de Eduardo Kneese de Mello – utilizando os elementos mouriscos
como base e referência para suas teorias: a influência islâmica na arquitetura
ibérica como base para o desenvolvimento (ou retomada) de uma arquitetura
tradicional por um lado, e por outro, essas mesmas influências como elementos
fundamentais do desenvolvimento de uma arquitetura nova, modernista.
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