sábado, 24 de janeiro de 2015

Arquitetura em Goiás IV

O ECLETISMO NA ARQUITETURA GOIANA

As primeiras manifestações de modernidade na arquitetura desenvolvida em Goiás, só vão se apresentar, nas décadas iniciais do século XX, com a chegada das primeiras composições ferroviárias, na região sudeste do estado.
Enquanto as demais regiões continuam a apresentar uma arquitetura de caráter mais tradicional com a representação de uma forma de construir e morar próprios do período colonial, as cidades do sudeste inovam, com o uso de materiais e técnicas diferenciadas, assim como com o emprego de um programa totalmente desconhecido dos goianos até então.
A implantação dos trilhos da Estrada de Ferro Goiás, no estado, desde sua primeira estação, no município de Catalão, provocou profundas alterações, a partir do momento em que seus primeiros edifícios – estações, galpões e residências de funcionários – passaram a demonstrar a possibilidade de se construir de forma diferenciada daquela tradicionalmente conhecida pelos goianos.
Estação de Tapiocanga, já demolida, utilizando materiais inovadores para Goiás.
A primeira inovação foi quanto ao uso do tijolo queimado em substituição ao adobe e a alvenaria de tijolo estruturada resolvendo de maneira satisfatória um trabalho que antes só era possível com o emprego de gaiolas de madeira. Permanece o uso de madeiramento apenas na cobertura, estruturando um telhado que apresenta, nesse momento, um ponto mais alto, exigido pelo novo tipo de telha utilizado. Passa a ser incorporada pela arquitetura desse período, a telha francesa, em substituição à tradicional telha capa-e-bica de quase dois séculos de uso na arquitetura goiana.
No piso, a mezanela, o tabuado corrido, a pedra e o chão batido, são substituídos pelo cimento queimado e pelo ladrilho hidráulico, assim como o estuque e o gesso passam a substituir a madeira na elaboração de forros, que deixam também de ser uma exclusividade dos compartimentos mais nobres da habitação para serem utilizados, em praticamente, todos os cômodos do edifício.
As primeiras construções desse período estão representadas pelos edifícios das estações ferroviárias, pelas casas dos funcionários e por galpões para depósitos de produtos. Posteriormente, com a intensificação dos meios de comunicação, representados pelo telégrafo, aparecimento do telefone, implantação de salas de cinema e principalmente do acesso que a população passou a ter a um considerável número de jornais e revistas publicados principalmente no Rio de Janeiro e São Paulo, também a arquitetura tanto residencial quanto comercial, passou a sofrer influências da modernidade arquitetônica em andamento, nos principais centros urbanos do país.
Localidades como Catalão e Ipameri, em um primeiro momento, e outras como Goiandira, Urutaí, Pires do Rio e Anápolis, posteriormente, recebem uma infinidade de edifícios com características ecléticas, representadas pelas referências neoclássicas, neogóticas – principalmente nas construções religiosas – neocoloniais, entre outras que, colocam essa região na posição de principal centro econômico e progressista do estado, em posição de destaque inclusive em relação à própria capital, Vila Boa.
Residência eclética em Catalão
De acordo com Borges (1990, p.121),

cidades como Catalão, Ipameri, Caldas Novas, Morrinhos e Corumbaíba receberam melhorias ou foram urbanizadas e logo passaram a contar com os benefícios das modernas invenções do mundo capitalista, como a energia elétrica, o cinema, o telefone e o telégrafo.

Assim, as cidades da região da estrada de ferro passam a se diferenciar das demais, por uma série de elementos inovadores e modernizantes, assim como passa apresentar uma arquitetura que vem inovar no uso de materiais, na forma como o edifício passa se relacionar com o terreno e, principalmente, na maneira como a planta da habitação se estrutura, propondo uma nova maneira de morar.
No mesmo período, algumas modificações passam a acontecer também na capital, com modificações significativas em sua arquitetura. Os edifícios públicos passam por uma série de alterações para que possam também apresentar alguns elementos de modernidade. Edifícios como o do Senado Estadual, do Mercado Municipal, do coreto, da antiga Casa de Fundição, recebem a aplicação de elementos decorativos em relevo, em suas fachadas, revestindo-se de uma modernidade que, entretanto, não alcança seus interiores.
Edifício onde funcionou a Casa de Fundição do ouro
Com isso, uma série de edifícios residenciais e comerciais começam e sofrer as mesmas influências, com a aplicação de elementos decorativos em suas fachadas, mantendo, no entanto, interiormente, a mesma organização tradicionalmente conhecida desde as décadas iniciais do século XVIII.
Ao observar as transformações ocorridas na arquitetura brasileira, a partir de finais do século XIX, Reis Filho (1976, p. 124-126), afirma que as modificações ocorridas, no interior dos edifícios, não interferiram na organização tradicionalmente conhecida até então, sendo conservadas a mesma implantação, mesma distribuição, mesmas técnicas construtivas e, em muitos casos, os mesmos profissionais. Ainda segundo esse autor, os elementos estruturais, pelo emprego corrente da terra como elemento construtivo, na forma de taipa-de-pilão, adobe e pau-a-pique, não permitiam a utilização de soluções mais complexas, como as colunatas, frontões ou escadarias. Sendo assim, os novos elementos decorativos a serem utilizados, restringiam-se à aplicação, nas fachadas, de platibandas, coroamentos com vasos e figuras de louça, e a substituição dos tradicionais arcos abatidos, pelos plenos, nas portas e janelas.
Com isso, o que se percebe, no caso da cidade de Goiás é que

essas modificações, surgem assim, com a aplicação de elementos das arquiteturas neoclássica e eclética nas fachadas das residências, sem, contudo, interferir na estrutura ou na organização interna desses edifícios. Aparecem então, em um primeiro momento, fachadas que se utilizam das platibandas, eliminando os beirais e sendo coroadas com pinhas e com vasos de louça colocados de forma a dar continuidade às falsas pilastras que passam a dividir, na vertical, as fachadas coloniais dos antigos edifícios, sem a presença de qualquer elemento decorativo ou em relevo. A utilização da cal nas fachadas, passa a ser substituída pela utilização de cores suaves, como o amarelo, o rosa, e o azul claro (Coelho, 2000, p. 53).

Em Ipameri, a partir de 1920, e até meados da década de 1930, uma infinidade de projetos arquitetônicos para edifícios residenciais vai ser desenvolvidos, apresentando um interessante repertório decorativo próprio da arquitetura eclética. Dentre eles, sobressaem-se as residências de Ataliba Bernardino, Olyntho Ribeiro, Albano Carvalho e Hormisdas de Carvalho.Para os edifícios comerciais, destacam-se os projetos desenvolvidos para Domingos Gomes, José Maltez, Bevinhati Salgado e Elias Miguel.

A residência de Hormisdas de Carvalho em Ipameri

O edifício residencial projetado, em 1924, por Waldemar Leone Ceva para o Sr. Hormisdas de Carvalho
Projeto de Waldemar Leone Ceva para o Sr. Hormisdas de Carvalho
 Apresenta todas as características de modernidade próprios do período, na região da estrada de ferro, em especial, na cidade de Ipameri.
Apresenta, como todos os edifícios dessa época, a cobertura, utilizando telha francesa, parcialmente escondida por uma platibanda decorada, dividida, como a fachada, em duas partes, apresentando cada uma delas, um desenho, definição de linhas e acabamento diferenciados. A parte da fachada correspondente ao escritório, se apresenta de certa forma mais sóbria que a outra, utilizando linhas retas no acabamento, o que é quebrado apenas pela forma circular que envolve a janela e os detalhes art nouveau da mesma. A parte correspondente à sala de visitas diferencia-se pelo excesso decorativo que vai da platibanda, na parte mais alta à janela gradeada do porão, que aparece aí em meio arco, contrastando com a forma retangular daquela correspondente ao escritório.
Aqui, já não aparece mais a porta de acesso, abrindo-se diretamente para a rua, mas para um jardim lateral, existindo como elemento intermediário, um alpendre, também lateral, estruturado em ferro fundido, decorado, cujo piso é revestido com ladrilho hidráulico.
A parte considerada nobre da residência, apresenta piso em madeira com detalhes no contorno, o que é indicado no desenho do projeto. Já as áreas correspondentes à cozinha, ao banheiro e despensa, por não apresentarem indicação do material a ser utilizado, levam à conclusão de que seria aí utilizado o cimento queimado simples.

Apesar de ainda se encontrar implantada no limite frontal do terreno, são largos os afastamentos laterais, sendo um deles, como já foi dito, utilizado para a implantação de um jardim, separado da via pública por uma pequena mureta com grade, o que facilita sua visualização por quem passa pela rua. O outro, fechado por muro alto, apresenta um portão largo, de madeira, utilizado provavelmente para acesso de serviço. 

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