segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

modelos brasileiros de igrejas com planta octogonal


forro apainelado octogonal da igreja de N. S. da Boa Morte
Com a colonização do Brasil levada a cabo pelos portugueses, a arquitetura implantada em nosso território se apresenta, em certos momentos, extremamente defasada, em relação ao que acontece em território português, desenvolvendo-se sempre com um certo atraso no que se refere aos modismos e mesmo aos períodos históricos por que passa a arquitetura portuguesa em sua porção européia.  Entretanto, em outros momentos apresentava um desenvolvimento que ocorria quase que simultaneamente ao que se estava desenvolvendo na metrópole. Exemplo desse paralelismo são os edifícios religiosos de planta octogonal construídos em território brasileiro que se desenvolvem praticamente ao mesmo tempo em que vão sendo desenvolvidos os edifícios religiosos de planta poligonal também em Portugal, se bem que ocorrendo no Brasil em número extremamente reduzido.
Segundo Pais da Silva (1993, p.137), mesmo que seja relativamente raro encontrar no Brasil, igrejas com o emprego de naves poligonais, é, no entanto freqüente o emprego de altares colocados junto ao arco cruzeiro, dispostos diagonalmente, quebrando assim a organização dos ângulos retos, o que faz com que um simples detalhe construtivo leve o observador à sensação visual de estar em um edifício de planta poligonal.
Tal situação, que é também encontrada em Portugal, talvez com a mesma freqüência, tem aqui, como exemplo, as igrejas da Conceição da Praia, na cidade de Salvador, na Bahia, e a igreja do convento de São Francisco, em Olinda, Pernambuco, e, apesar de darem a impressão de possuírem planta octogonal, essa figura se apresenta de tal forma irregular que mais representa um retângulo de ângulos cortados, não existindo relação de harmonia entre as medidas dos seus oito lados.
De acordo com os estudos de Paulo Santos (1981, p.26), a arquitetura desenvolvida em Lisboa é, no século XVIII, o elemento maior de influência e orientação, principalmente para a arquitetura religiosa em construção na cidade do Rio de Janeiro. Dois edifícios se destacam aí nesse período, por possuírem plantas não regular, que são as de Nossa Senhora da Glória, considerada por esse autor como sendo a jóia do século, construída em 1.730, e a de São Pedro dos Clérigos, de 1.733.
A igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro tem sua nave de traçado octogonal percebida tanto pelo interior quanto pelo exterior, sendo a única na região sul do país a apresentar tal característica, abandonando por completo as formas retangulares, inclusive na capela-mor e na sacristia, formando sua planta um oito, desenvolvido em linhas retas, pela união de dois octógonos irregulares, um na nave e outro englobando os restantes compartimentos da edificação.
Igreja de N. S. da Glória no Rio de Janeiro

São Pedro dos Clérigos, demolida em 1.924 em decorrência do alargamento da avenida Presidente Vargas, possuía seu corpo desenvolvido em linhas mais curvas, arredondadas, característica que se apresentava também em sua fachada.
Fachada da igreja de S. Pedro dos Clérigos do Rio de Janeiro

Construídas praticamente no mesmo período, têm essas duas igrejas seus projetos atribuídos ao Cel. José Cardoso Ramalho. Paulo Santos (1981, p.27), se não coloca dúvidas, pelo menos sugere reservas quanto à aceitação de tal informação. Segundo esse autor, na igreja da

Glória a originalidade da planta não apaga a rigidez dos traçados retilíneos, a contenção de propósitos e o peso da construção (espessura das paredes); na de São Pedro o traçado amolece nas formas polilobadas dos nichos laterais e do pórtico, e a maneira por que entre uns e outros se inserem as elaboradas torres (em que o círculo e o quadrado se entrecortam), revelam virtuosismo amaneirado, ou seja: projetista de temperamento diverso do da outra igreja.

            O exemplar encontrado no nordeste que melhor representa o modelo em estudo, a igreja de São Pedro dos Clérigos do Recife, tem data de construção praticamente do mesmo período das duas construídas no Rio de Janeiro, sendo todas elas contemporâneas à de São Pedro dos Clérigos da cidade portuguesa do Porto.
Esse edifício pernambucano apresenta a fachada dentro do esquema mais tradicional desse tipo de edificação, que é aquela com características maneiristas e duas torres laterais.
Igreja do Mosteiro da Luz em São Paulo

No estado de São Paulo, também duas edificações religiosas apresentam-se com esse tipo de planta, que são as igrejas de Nossa Senhora da Luz e a capela da Ordem Terceira de São Francisco. Essas duas construções têm suas histórias ligadas ao nome do religioso franciscano, de formação jesuíta, frei Antônio de Santana Galvão, responsável por uma série de obras realizadas nos dois edifícios, sendo que a mais importante foi a mudança do eixo principal da igreja da Ordem Terceira que, de acordo com Benedito Lima de Toledo (1986, p.132), ficou praticamente imperceptível, provavelmente por se tratar de um edifício cuja planta da nave se apresenta como um octógono, o que não aconteceria, se o desenho fosse baseado no retângulo, que era a característica geral dos edifícios religiosos da época.
As principais construções religiosas da região do ouro, em Minas Gerais, demonstraram em seu apuro, um minucioso trabalho de estudo e evolução proveniente dessas construções de planta octogonal.
Uma das mais interessantes, e provavelmente a mais simples de todas, é sem dúvida a de São José de Minas Novas, na região de Diamantina, que, de acordo com os estudos de Sylvio de Vasconcellos (1959, p.30), tem sua planta octogonal baseada em uma construção francesa dos Templários, do século XIII.
Igreja de São José de Minas Novas
A arquitetura desenvolvida pelo barroco mineiro, principalmente a de características religiosas, alcançou uma evolução não conseguida em nenhuma outra parte do território português, quer metropolitano, quer colonial. Exemplos maiores desses edifícios nessa região são as igrejas de São Pedro dos Clérigos, de Mariana, construída em 1.760, e a de Nossa Senhora do Rosário de Ouro Preto, provavelmente de 1.785 que, segundo Suzy de Mello, teriam sido inspiradas nas de Nossa Senhora da Glória, do Rio de Janeiro, e São Pedro dos Clérigos, da cidade do Porto, em Portugal.
Tal inspiração, principalmente no caso da igreja de Nossa Senhora da Glória, fica bem caracterizada pela proximidade das formas, em que o oito de linhas retas da planta da igreja carioca é substituído por outro de linhas curvas, nas igrejas mineiras, utilizando já, não a forma octogonal, mas a sua evolução para a elipse.
Entretanto, em oposição ao que diz Suzy de Mello, encontramos em Pais da Silva (1993, vol. II, p.125) uma opinião diferente, onde o autor não vê a planta de São Pedro dos Clérigos do Porto como base ou inspiração para nenhuma outra, o que não ocorre, segundo esse autor, com relação aos elementos decorativos aí encontrados.
De qualquer forma, sendo ou não inspiração para as edificações mineiras, o fato é que tal igreja apresenta, com um grau menor de apuro, a forma elíptica em sua nave (e somente aí), que como aquelas, é facilmente detectado pelo exterior.

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