quinta-feira, 2 de julho de 2009

o ecletismo na arquitetura da cidade de Ipameri


Os primeiros edifícios construídos em Ipameri, com as novas características arquitetônicas implantadas em decorrência da chegada da ferrovia apresentam como principal característica de fachada, a utilização da platibanda escondendo o telhado, decorada com frisos e cimalhas que, de certa forma, se repetem como sobrevergas na parte superior das aberturas que, na maioria dos casos se restringem a janelas. Passam, esses elementos decorativos, ao longo da década de 1920, por uma série de modificações, apresentando-se inicialmente em linhas retas e paralelas ao piso, passando posteriormente a utilizar formas triangulares, à moda de frontões, associando linhas retas e curvas e mesmo apresentando envasaduras de formas variadas.
Entretanto, ao mesmo tempo em que os construtores e mestres de obras apresentavam, junto à prefeitura, seus projetos e desenhos com características neoclássicas, outros projetos eram registrados, assinados por profissionais de formação acadêmica, onde os elementos característicos não são mais os de tendência neoclássica, mas aqueles de um ecletismo mais depurado, com composição elaborada a partir de estudos e critérios mais aprofundados.
Surgem assim, ainda durante a década de 1920, um número considerável de projetos para edifícios tanto residenciais como comerciais apresentando composição bem mais elaborada, não só no que se relaciona a conceitos como também sugerindo inovações no uso de elementos, relevos e materiais, tanto construtivos quanto decorativos.
Um dos projetos mais característicos desse período foi elaborado por Waldemar Leone Ceva para Albano de Carvalho, a ser construído em um terreno hoje incorporado à atual Praça Getúlio Vargas, em frente à Matriz. Esse edifício inova não só no que se relaciona à composição de fachada, mas também na organização da planta, que, apesar de apresentar apenas um dormitório, indica a existência de um compartimento para “toilette”.
projeto de Leone Ceva para Albano de Carvalho, em 1924

Ao comentar a implantação dos edifícios residenciais nos terrenos, Reis Filho (1976, p. 46) diz que a relação do edifício com os jardins laterais se apresentava dificultada pela altura que as construções adquiriam, em decorrência da instalação dos porões altos. Resolvia-se, então, a questão da altura, com a colocação de alpendres, em sua maioria profundos, cuja cobertura se apoiava, na maioria das vezes, em colunas de ferro, acessados por meio de escadas com degraus de mármore.
Exemplo dessa observação de Reis Filho pode ser encontrado em Ipameri, no projeto de Leone Ceva para Hormisdas de Carvalho, ainda em 1924, construído à Rua Eugênio Jardim, pelo construtor português José Perdiz. O jardim lateral, com caminhos e canteiros separa-se da via pública através de um gradil de ferro e um pequeno portão do mesmo material que, apesar de delimitar os limites do público e do privado, não impede a visualização do acabamento com que o jardim foi tratado. O alpendre, nesse caso é acessado por uma pequena escada de seis degraus e apresenta, pela forma como está graficado, o piso em ladrilho hidráulico. A cobertura desse alpendre é exatamente o descrito por Reis Filho em seu estudo sobre a arquitetura paulistana, ou seja, apoiada em colunas de ferro e apresentando inclusive elementos decorativos a moda de mão francesa com desenho em linhas curvas e recurvas.

projeto de Leone Ceva para Hosmisdas de Carvalho, também de 1924

A residência para Hormisdas apresenta todo um trabalho de fachada dentro dos conceitos do art nouveau, com linhas curvas na decoração das janelas, assim como no tratamento das folhas, onde madeira e vidro são trabalhados de forma bem própria do estilo. Outra questão explorada pelo arquiteto foi a inclinação do terreno, permitindo trabalhar de forma diferenciada, as aberturas para ventilação do porão alto, dando maior movimentação ao conjunto.
Se na residência de Albano o ecletismo da fachada se apresenta através da exploração de uma decoração em linhas retas, as curvas na de Hormisdas, vão aparecer até mesmo na composição da platibanda e no avental da janela da sala de visitas, que imita o desenho desenvolvido para a bandeira dessa mesma janela.
Ainda nessa década, interessantes projetos comerciais foram também desenvolvidos para a cidade, com os elaborados para Elias José & Cia., Elias Miguel, Bichara Daher e Irmão e Jacob Daher & Cia., entre outros.

projeto de um armazém para Elias José e Cia. sem registro de autoria

Entretanto, nenhum deles apresenta o acabamento e o apuro de detalhes que o projeto de Leone Ceva – construído por Agnelino Edreira – para a Farmácia Central, edifício de propriedade de Bevinhati Salgado, construído à Praça da Liberdade e, se bem que totalmente descaracterizado, ainda existente no local. A própria apresentação do projeto, em papel linho pode ser visto como um trabalho de arte. É um projeto que associa elementos mais austeros, como a platibanda reta com desenhos decorativos geométricos e elementos decorativos sobre a marcação das falsas colunas laterais. Convém observar que esses elementos decorativos reproduzem o símbolo da farmácia, com duas cobras envolvendo um cálice. O jogo de formas e a manipulação do equilíbrio dos elementos contribuem para a qualidade do desenho. Bandeiras em grade de ferro com monogramas e a data de construção do edifício são também utilizados, além do interior da farmácia apresentado de forma perspectivada.

projeto de Leone Ceva para a Farmácia Central, de Bevinhati Salgado

A década seguinte apresenta ainda um número considerável de novos edifícios construídos dentro dos conceitos do ecletismo, mesmo sendo o período de grande avanço do art déco na cidade. Os anos iniciais da década, principalmente até 1935, são marcados pela construção dos chalés.
Frederico Schmaltz, com seu trabalho de desenho e construção, é um dos profissionais que mais produz dentro desse modelo. São de sua autoria – assinando como agrimensor – os projetos para Dionizio Jacob e Anísio Alkemim. Também Leone Ceva desenvolveu alguns projetos nessa linha, sendo os que mais se destacam, aqueles de propriedade de Arlindo Carvalho e o de Ana d’Almeida Costa. Também o projeto de R. Vazzoler, para Ataliba Bernardino, ainda existente à Praça da Liberdade, apresenta consideráveis qualidades, tanto de composição de fachada quanto de organização e distribuição interna.

projeto de Frederico Schmaltz para Anísio Alkemim, de 1939


projeto de R. Vazzoler para Ataliba Bernardino, de 1933

A década de 1940, se bem que de grande produção déco, apresenta ainda alguns projetos de chalés, como os de Leone Ceva para Delmiro Dias, Zélia Portella, Joaquim Araújo e Silvio Porto. Em 1948, João Pinho Junior, médico sanitarista, responsável pela aprovação de projetos junto à prefeitura, também construía sua residência, dentro dessas características.


projeto de Leone Ceva para Zelia Portella, de 1940

Na cidade de Ipameri, as influências do ecletismo ainda encontram eco já avançada a década de 1950, com a construção de alguns edifícios residenciais com características neocoloniais, como é o caso dos projetos de Pytha, para Calixto Miguel Semereme, de 1955 e de José Ribeiro, para Mário Vaz, datado de 1956, ou ainda aquele elaborado por Leone Ceva para o Colégio Nossa Senhora Aparecida.


projeto para Calixto Miguel Semereme, assinado por "Pytha", de 1955

Interessante observar que a década de 1950, para a arquitetura desenvolvida em Ipameri, representa um momento intensamente “eclético”, pois estão sendo construídos, nessa década, edifícios com características neocoloniais, déco e mesmo modernistas, como algumas residências à Rua Padre Pezzutti.
obs: as imagens de projetos de arquitetura da cidade de Ipameri utilizadas nesse blog fazem parte do acervo do Instituto Simão Edreira, daquela cidade.

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