Também assinado por Luiz da Cunha Menezes, esse documento, datado de 18 de dezembro de 1782 dá notícias sobre o trabalho de pacificação dos índios Caiapó e encaminha o plano para a construção de uma aldeia destinada à redução desses índios. Tanto o documento quanto os desenhos se encontram no Arquivo Histórico Ultramarino, de Lisboa. No que se relaciona aos desenhos, são duas cópias do mesmo plano, sendo que um deles parece ser o rascunho do outro.
O documento:
página de abertura do documentoEm carta de 20 de março do ano de 1780, dei conta a Sua Majestade, pela mão de Vossa Excelência, e dirigida pela capital da Bahia da empresa que tinha intentado de civilizar as gentes silvestres da Nação Cayapó, e do feliz sucesso que tinha tido a dite empresa até aquele tempo na sua primeira tentativa.
Igualmente a mesma diligência fiz pela via do Rio de Janeiro em carta de 20 de julho do ano seguinte de 1781 circunstanciando todos os felizes sucessos da dita empresa e do primeiro estabelecimento que tinha feito para desistência sociável da referida Nação Cayapó, sob a Alta Proteção de Sua Majestade e que por essa razão o tinha denominado Aldeia Maria, a primeira.
desenho do plano (provavelmente o rascunho) para construção da aldeiaLembro-me também, de que na mesma carta dizia a Vossa Excelência, ter sido situada a dita Aldeia, no Rio dos Índios, por equívoco que houve nos exploradores daquela campanha, quando ela é situada na margem do Rio Fartura, assim como depois se verificou pela navegação; que fiz abrir da Aldeia de São José de Mossâmedes para aquela, e para maior facilidade da condução, ou transporte dos fornecimentos de comestíveis, e materiais necessários para sua construção.
Agora, que nesta ocasião, que parece que a Mão onipotente está protegendo essa diligência, afim de que a gente silvestre da dita Nação venha gozer de uma vida sociável debaixo do Soberano Domínio, e Alta Proteção de Sua Majestade, com a felicidade de conhecerem os verdadeiros costumes e dogmas de nossa Santa e verdadeira Religião, tenho a honra de segurar na presença de Sua Majestade, pelo Ministério de Vossa Excelência, que em dias do mês de setembro do mesmo ano de 1781 desceu mais gente da referida Nação Cayapó, como se vê na Carta nº 1º, conduzida por dois soldados Pedestres e um índio da mesma Nação, que os foram buscar nos seus mesmos alojamentos, ou aldeias, e que por ter dado alguma providência, para que fosse logo, direto para a dita Aldeia Maria a primeira, chegaram a ela no dia 27 do dito mês, como também serve a Carta nº 1º do sargento da Companhia de Pedestres, e regente da mesma Aldeia, por ter sido não só o primeiro explorador e agente desta empresa tão importante, como muito capaz da dita diligência e familiaridade que tem adquirido com aquela gente silvestre.
Depois de estarem já estabelecidos na dita Aldeia, e unidos aos mais, que já lá se achavam aldeados, como primeiros Instituidores da referida Aldeia, tive aviso de que estava para chegar outra mais numerosa, e conduzida também por dois soldados Pedestres e outro índio da mesma Nação, e de uma situação tão distante, como é da altura da Camapuã e, que por não quererem deixar de vir a esta Capital. Ver o Capitão Grande – que é o nome que me dão – mandei que viessem sem demora, assim como mostro igualmente pelas Cartas Nº 3º e 4º do capitão da Companhia de Pedestres João Grand-Ley que se acha destacado nas sondas das terras diamantinas, dos rios Claro e Pilões, e onde tem feito além deste serviço, um não pequeno a Sua Majestade, na aquisição destas gentes silvestres, como se pode ver das sobreditas Cartas, e pelo que se faz digno de que Sua Majestade lhe remunere este, como lhe parecer mais justo, e queira também haver por bem mandar lhe confirmar a sua patente de capitão.
Depois de terem chegado a esta capital, mandei batizar, na minha presença, e de seus mesmo pais, todos os que mereceram. Receber esta graça, pelas suas pequenas idades, assim como se verifica da Lista Nº 5º, que está também adjunto.
Com o numero das ditas gentes silvestres, destas duas aldeias, que acabo de referir, unido aos das gentes também silvestres, que já se achavam aldeados e sob o Soberano Domínio e Proteção de Sua Majestade na dita Aldeia Maria, se completou o total de 555 almas que atualmente ficam existindo, na referida Aldeia, incluindo neste número 328, que se tem batizado; por diferentes vezes na minha presença e na mesma Aldeia; pelo vigário de São José de Mossâmedes; por estar encarregado da direção espiritual daquela mesma Aldeia enquanto se lhe não nomeia vigário próprio.
Na estampa inclusa, se mostra a direção; com que estabeleci aquela mesma Aldeia e o adiantamento em que está até o ponto de hoje, a sua construção, que me parece ter sido proporcionada, e acomodada ao natural de uns habitantes que nasceram e sempre viveram no mato gozando de um ar livre.
desenho do plano, provavelmente o definitivoDevo enfim então dizer a Vossa Excelência, que além da utilidade, e não sei se a principal, que se tem tirado de se terem, ou estarem em termos, de se civilizarem tantas gentes silvestres, se tem tirado uma outra não pequena, para esta Capitania, e seu aumento, qual é a de se terem passado mais de três anos, ou desde a época, que dei princípio a esta empresa, sem se ter experimentado os insultos e mortandade, que fazia todos os anos, e por diferentes vezes, a referida Nação Cayapó, aos vassalos de Sua Majestade, de maneira, que até ao ponto de fazer esta, não tenho tido notícia alguma, de uma só morte, que tenha feito a sobredita Nação daquele tempo pra cá, antes pelo contrário, sempre tenho recebido pelo regente da referida Aldeia, as agradáveis notícias do contentamento, em que se acham todos aqueles seus habitantes; pelo que julgo, que esta gente silvestre das quatro aldeias, que se acham já recolhidas na referida Aldeia Maria, a primeira, e habitavam as grandes campanhas que medeiam entre as últimas povoações desta Capitania e o varadouro de Camapuã; por serem as mais vizinhas, é que vinham fazer as referidas hostilidades, que se lhe sofriam, e que felizmente tem sanado.
É bem certo, que sem embargo da sua brutalidade e falta de costumes humanos, que lhes não tinham razão para obrarem ao contrário; pois que não lhe falta nada do necessário para sustentação da vida humana, nem são constrangidos a coisa alguma, que os escandalize, pelo modo com que os faço tratar, vão trabalhar na roça se querem; quando querem, e o tempo que lhes parece, e igualmente em ajudarem aos trabalhos, da construção da sua Aldeia, e montariar sempre que lhes parece o que não deixa de ser um golpe econômico, e que contribui muito para ajuda do seu sustento; por serem insignes caçadores, e um exercício, com que foram criados, e que lhe é mais agradável.
Deus guarde a Vossa Excelência
Vila Boa, 18 de dezembro de 1782
Luis da Cunha Menezes